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Refletindo sobre o impacto de Resident Evil 2

Hoje, após pouco mais de um mês com Resident Evil 2, me sinto na liberdade de escrever sobre ele. Essa postagem não almeja ser uma análise muito crítica, isso eu deixo para a crítica especializada. Também não tenho a intenção de um ensaio psicológico sobre o tema, apesar de que posso acabar desenvolvendo isso em menores escalas. Gostaria apenas de descrever minha experiência. Caso você queira entender o contexto, pode conferir minha primeira postagem sobre o jogo aqui.

Meus primeiros passos após a introdução dos personagens foram caóticos. Era frustrante ter de me apressar para sobreviver a uma cidade infestada pelos caídos e ainda querer apreciar o maravilhoso trabalho feito pelo time de desenvolvimento da Capcom. Meu coração batia forte, a ambientação e a música apresentavam bem o tom mais realista que os desenvolvedores buscavam. Fazia muito tempo que eu não me sentia assim em um jogo de terror, “Meu Deus, a cidade foi devastada mesmo, não há mais volta”. Entretanto, eu esperava passar mais tempo nessas ruas, eu gostaria de ter pelo menos mais cinco minutos para realmente absorver a magnitude dos eventos.

E, então, chegamos até a icônica Raccoon City Police Department.

Posso descrever que meus sentimentos foram indescritíveis (haha). É difícil colocar em palavras a sensação de estar ali, depois de mais de vinte anos do lançamento do jogo original, sete anos do lançamento do primeiro Remake e da promessa do segundo e de três anos de silêncio após o anúncio oficial. Este início foi um tanto quanto normal. Já havia feito os mesmos passos durante a demonstração gratuita lançada um pouco antes. Eu me obriguei a andar por boa parte do jogo. Eu queria aplicar nesse momento o que eu digo para todos os meus pacientes, isto é, aproveitar as pequenas coisas da vida, viver o momento e deixar que o futuro aconteça naturalmente, planejar apenas o necessário. Eu estava quase jogando um RPG, queria me sentir naquela situação. Eu não correria freneticamente, eu não desperdiçaria meus recursos, uma decisão malfeita significaria que essa noite chuvosa jamais veria a luz do dia.

E é exatamente isso que eu adoro no Terror de Sobrevivência, subgênero do terror nos vídeo games que foi apresentado pelo próprio Resident Evil original de 1996 e que Remake 2 (percebeu o que eu fiz ali?) consegue reproduzir com maestria e elevar um degrau acima. Veja bem, o medo primário induzido por esse subgênero não é o dos monstros, o do ambiente ou o de jump scares baratos (tanto que existem pouquíssimos no jogo), mas sim o medo de não ter recursos suficientes para sobreviver. Você não é encorajado a matar todos os inimigos no jogo, até porque você não tem munição para todos eles. Assim, a mecânica do jogo te força a planejar cuidadosamente cada tiro, cada item de cura, cada rota que você pretende seguir, além de dominar perfeitamente os controles para desviar do maior número de inimigos possíveis. Na sua primeira vez no jogo, você nunca sabe quando três zumbis podem te tomar a munição necessária para enfrentar um chefão daqui duas salas.

Eu senti pavor, algumas vezes esquecia de respirar e minha mão suava toda vez que o T-103, também conhecido como Mr. X, aparecia no mesmo ambiente que eu. Sua trilha sonora, seus passos pesados e altos que podem ser ouvidos de longe eram uma forma psicologicamente pensada de induzir ansiedade e pânico. Você não pode derrota-lo, não importa seu arsenal, você só pode atrasa-lo ou despista-lo. É um jogo de gato e rato tão intenso quanto o de Alien Isolation. Quando o Tirano é introduzido na equação, os riscos aumentam. Ele pode ouvir seu confronto com outros inimigos de longe, então, você deve eliminar esse zumbi, que por si só pode tomar uma punição tremenda até morrer definitivamente e correr o risco de atrair a atenção de Mr. X, ou você tenta despistar o morto vivo e manter o gigante longe da sua cola? Decisões, decisões. Me chame de louco, mas Mr. X me fez ficar densamente ansioso para ver a reimaginação de Nemesis.

O tema “Black Impact” do Mr. X me faz lembrar do tema tão icônico de Michael Myers, criado por John Carpenter para a franquia Halloween. Devido às circunstâncias, talvez temos aqui uma inspiração/homenagem?

Não posso esquecer da ambientação e da música. Perceba que citei os dois ao longo da minha história. A RPD nunca foi tão grotescamente linda e desolada. O estudo de ambiente e o cuidado dos artistas é quase palpável. Muitas vezes o cenário sozinho era responsável por transmitir uma sensação de insegurança e por contar histórias que apenas o jogador com olhos atentos poderia ler. A música e os efeitos sonoros foram outro ponto alto da jornada. Variando do épico para as lutas contra as mutações de William Birkin ou a fuga do laboratório, até o soturno e sombrio silêncio mortal que impera em uma cidade devastada pela ganância e falta de escrúpulos. Percebi que os desenvolvedores conseguiram o equilíbrio quase milagroso entre o terror e a sensação galhofa que é uma característica tão presente de toda a franquia. Resident Evil 2 se leva a sério na medida certa para te fazer pensar sua próxima jogada, mas também é zoeiro o suficiente com frases de efeito e sarcasmo para te entregar tão necessários momentos de alívio da tensão.

Nada disso mencionado acima seria tão eficaz se os personagens não fossem bem desenvolvidos. E como eles foram! Me identifiquei ainda mais com Leon, tive uma nova e mais forte apreciação por Claire, Ada deveria ter essa caracterização desde o começo, Sherry tem um seguimento que a faz mais justiça que o original, Delegado Irons foi transformado no verdadeiro maníaco que sempre pareceu ser e, claro, a Annet e William Birkin ganham mais notoriedade e humanidade (ou falta dela, depende do ponto de vista). Contudo, talvez os principais personagens sejam os zumbis. Os produtores apontaram em várias entrevistas que tentaram fazer dos zumbis personagens tão importantes quanto os vivos. Detalhes podem ser observados (no menu bônus, não aconselho fazer isso em tempo real) nas roupas, rosto e acessórios destas vítimas que nos mostram os últimos momentos de humanidade das pessoas que um dia eram donas destes putrefatos corpos.

Não querendo me delongar mais que o necessário, talvez minha única crítica seja a falta do sistema zapping. Veja, no original, esse sistema significava que alterações feitas no cenário com o primeiro personagem fariam impacto direto na jornada do segundo personagem. Pegue uma arma com Claire e essa arma não aparecerá para Leon. Libere uma área com Leon e essa área estará disponível para Claire depois. Aqui, em 2019, isso foi removido. O que fica é uma estranha impressão de desorganização. Se Mr. X já removeu o helicóptero caído do segundo andar da ala leste da delegacia durante o segmento de Claire, por que o fez de novo no segmento de Leon? Se Leon libera a passagem até o escritório do Delegado Iron e Claire tem a chave para abri-lo, por que para ele o escritório é inacessível e, para ela, esse atalho nunca é liberado? Enfim, quanto mais você pensa sobre isso, mais percebe que talvez tenha sido a única desequilibrada que impediu o jogo de se tornar, completamente, perfeito.

Personagens antigos estão de volta e com uma carga emocional que arrisca tirar algumas lágrimas de quem joga.

Existe muito o que se falar desta obra, mas não pretendo tomar mais seu tempo e fazer um vídeo é uma tarefa fortemente desencorajante pra mim. Agradeço se chegou até aqui e concluo que esta reimaginação do clássico consegue se igualar e, em algumas áreas, superar o original. As minhas preocupações quanto a perspectiva, dublagem e ambientação foram completamente destruídas. No momento da escrita deste texto, já alcancei 100% do que se poderia fazer no jogo e ainda continuo me divertindo, até nisso esta reimaginação conseguiu manter o alto nível. Me vejo jogando Resident Evil 2 Remake todos os anos por muitos anos, assim como fiz com o original até hoje. Obrigado, Capcom. E que venha Jill Valentine e os últimos momentos de Raccoon City.

Não merece menos!

 

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