Dor. Amor. Saudade. O preço do pão. Greves. Desigualdade social. Medo. Perseguições. Prisões. Tortura. Exílio.
É o que Ferreira Gullar fala em “Dentro da noite veloz”, volume de poemas lançados em 1975, resgatados esse ano pela Companhia das Letras com uma edição nova. Poemas que denunciam os anos difíceis do país em plena Ditadura Militar.
Ferreira Gullar era Nordestino, de São Luiz do Maranhão, e sua obra poética “reflete a necessidade moral de lutar contra a injustiça social e a opressão.” Com uma poesia engajada e sua militância política, foi fortemente perseguido pela Ditadura Militar. Foi exilado e durante esse período escreveu “Poema Sujo”, seu trabalho mais conhecido e explorado, considerado obra-prima e indispensável para compreensão da literatura moderna no Brasil.
Os poemas de “Dentro da Noite Veloz” não fogem ao seu estilo e nem teria como. São poemas inquietos, de quem procura uma resposta para aquela realidade cruel. A sensibilidade poética é muito particular, mas em cada página sentimos a angústia a melancolia que o autor impôs. E apesar de uma escrita excepcional, a linguagem não é pomposa, é clara e direta.
Ao longo da vida, li alguns trechos da obra do autor, mas essa foi a primeira experiência completa que tive com o Ferreira Gullar e foi realmente especial. Isso porque, os sentimentos que os poemas exalam dialogam muito com a realidade hoje, essa aura de medo, de incerteza e de dificuldades.
“Quem fala em flor não diz tudo
Quem me fala em dor diz demais”
Mas apesar de dor, Ferreira Gullar mantém aquele fio de esperança e resistência. Descartando qualquer tipo de neutralidade e militando com poesia, mesmo assumindo que ela não mudaria o mundo, “sempre falou e escreveu com determinação e coragem.”
No prefácio, Armando Freitas Filho aponta: “É isso que este livro imenso nos mostra: a vida, a aventura, o perigo do universo que nos convida para a peripécia existencial de cada um de nós. Ninguém melhor que Ferreira Gullar para nos fazer viver e morrer, com sua experiência humana e destemida que passa dentro dessa noite feroz e veloz, sempre a postos para uma nova e — se necessário for — combativa manhã”.
“A vida é pouca
a vida é louca
mas não há senão ela.
E não te mataste, essa é a verdade.
(…)
De fato,
o homem está preso à vida e precisa viver
o homem tem fome
e precisa comer
o homem tem filhos
e precisa criá-los
Há muitas armadilhas no mundo e é preciso quebrá-las.”
A experiência de leitura do volume de um modo geral é bem profunda, mas a leitura do poema “Não há vagas” é algo imensurável, não há como não se impactar.
Ao final da leitura, refletindo sobre o livro e relendo as marcações, sempre voltava para esse poema. É difícil analisar poesia, pois como falei, a sensibilidade é muito particular de cada leitor, mas acho que se o livro fosse um corpo, as vísceras dele seriam esse poema, não consigo pensar em outra definição melhor. É simples, seco, pungente e é tristemente o espelho de uma realidade vivida, ainda hoje, por muitos.
Leitura indispensável!
Onde Comprar:
Submarino
ISBN-13: 9788535931648 | ISBN-10: 8535931643 | Ano: 2018 | Páginas: 120 | Editora: Companhia das Letras
{ Esse livro foi enviado pela editora Companhia das Letras para resenha no blog. Em compromisso com o leitor, sempre informamos toda forma de publicidade realizada pelo blog }
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Não sou muito de ler poemas, mas é sempre bom ter indicação de livros nacionais. Não conhecia e nunca tinha ouvido falar desse. Adorei a dica!
Simplesmente incrível sua análise. Parabéns!!