Em 2015 Aleaguara, uma editora do grupo Companhia das Letras lançou Ainda Estou Aqui do Marcelo Rubens Paiva, que já contou boa parte da sua vida pessoal no famigerado Feliz Ano Velho (que pretendo ler em breve). Dessa vez destaca a luta pela verdade. Uma espécie de livro de memórias da família Rubens Paiva, que traz como personagens principais seu pai, a Ditadura, e como ele mesmo falou, a heroína da história, sua mãe Eunice Paiva. Considerado também como um relato importante e bastante pungente de um dos capítulos mais devastadores da história do Brasil.
Bom, e assim como vimos na escola e que o autor reforça, o Golpe de 64 foi uma iniciativa em conjunto de alguns políticos e militares de desbancar o Governo de João Goulart, o Jango. A princípio o Regime duraria dois anos, e após esse período, o Estado se redemocratizaria. E como é de conhecimento geral, o regime não durou apenas dois, mas sim vinte e um anos.
“O Golpe sofreu um golpe. A ditadura se impôs sobre a ditadura(…)”
A partir de 64, o golpe já estabelecido, muitos políticos de oposição ao Regime foram cassados. Alguns foram exilados, outros exilaram a si próprio. E além deles, muitas outras pessoas foram perseguidas – escritores, atores e atrizes, cantores, estudantes, cantores, etc.- por serem apontados como rebeldes, comunistas, (embora muitos não fossem), terroristas e por aí vai.
Rubens Beyrodt Paiva era um Deputado, foi uns dos políticos cassados em vista do Golpe. E em 1971 foi preso por militares e depois disso “desapareceu”. Somente anos depois sua morte foi confirmada: ele foi torturado e morto mais ou menos dois dias depois de ser preso.
Com a morte de Rubens, Eunice Paiva, mãe de 5 filhos, teve que se reinventar e se manter firme a frente da família e mesmo com as incertezas acerca da morte do marido, seguiu com a vida e se tornou uma figura importante no meio jurídico. Lutou por justiça em nome de Rubens (e o caso ainda segue até hoje no STF), e tornou-se também defensora dos direitos indígenas. Infelizmente, mesmo depois de tanto sofrimento ela, e novamente a família inteira, foram impostos à mais um capítulo brutal da história deles, dessa vez causado pela descoberta do Alzheimer.
“(…)Eu tinha, sim, ódio dos militares. Do poder. No entanto assistir à atuação dela me ensinou a não alimentar revanchismos. Ao invés de se fazer de vítima, ela falava de um contexto maior, entendia a conjuntura do continente, sabia ser parte de uma luta ideológica. Era mais uma Maria (Maria Eunice) cantada por Elis Regina(…) Nunca se deixou cair no pieguismo(…) Não culpou esse ou aquele, mas o todo. Não temeu pela vida. Lutou com palavras.”
A narrativa s divide em 3 partes e é pautada de forma a não se ater muito a cronologia dos fatos. O autor, por vezes, mistura fatos do passado para “exemplificar” os do presente, ou vice e versa. Os capítulos se referem a determinados períodos da vida da família. O livro é angustiante em muitos aspectos e por vários motivos que não são difíceis de imaginar, a cada página o leitor fica mais perplexo e emocionado. Mas apesar disso, Marcelo tem uma escrita limpa, sem rodeios e confortável de se ler.
O que achei bem interessante, é que Marcelo não tenta narrar a perspectiva da Eunice, especificamente, e sim a perspectiva DELE em relação aos movimentos DELA em todos os acontecimentos. Ou seja, ele passa ao leitor a visão do filho vendo a mãe renascendo, das mais diversas formas, diante das dificuldades, do sofrimento, das incertezas, das oportunidades, das vitórias… Do Alzheimer.
“Descobri que Eunice não foi uma só. Existiram algumas que não se contrapunham, completavam-se, não se contradiziam, somavam-se, reconstituíam-se da tragédia, alimentavam-se dela para renascer.”
A leitura desse livro é importante não só pela literatura mas por ele ser um exemplo real do sofrimento e a devastação que a ditadura casou em muitas pessoas. E em tempos de política torpe e da Democracia ameaçada, é importante pensar nas questões sociais do passado para entender as de hoje. Saber um pouco mais da história do país, e tentar entender porque tantas visões míopes e extremistas foram “abraçadas” (e ainda são) e como as consequências disso ainda são sentidas hoje, é um estudo mais do que necessário.
De muitas pessoas que já o leram, a recomendação é sempre a mesma, e eu me junto ao coro: LEIAM, LEIAM, LEIAM!
ISBN-13: 9788579624162 | ISBN-10: 8579624169 | Ano: 2015 | Páginas: 296 | Editora: Alfaguara
Marcelo Rubens Paiva: Nascido em São Paulo em 1959, aos 11 anos de idade sofreu o primeiro grande baque de sua vida: o desaparecimento do pai (o ex-deputado federal Rubens Paiva) pela ditadura militar.Um despertar violento da consciência política. Estudou na USP e Unicamp. E então aos 20 anos de idade , ele sofreu o segundo grande baque: um acidente que o deixou tetraplégico. Hoje, com muita fisioterapia, voltou a locomover as mãos e os braços. Desde 1989, depois que estudou dramaturgia no CPT do Sesc, em São Paulo, ele estreou no teatro com a peça 525 Linhas, dirigida por Ricardo Karman. Em 1998, estreou E aí, Comeu?, peça dirigida por Rafael Ponzi, que depois mudou de nome pra Da Boca Pra Fora. Com ela, ganhou o Prêmio Shell, melhor autor, em 2000.
{ Esse livro foi enviado pela editora Alfaguara. para resenha no blog. Em compromisso com o leitor, sempre informamos toda forma de publicidade realizada pelo blog }
Baci ;*
Aproveite para nos seguir nas redes sociais!
Facebook ? Instagram ? Twitter ? Tumblr ? Google + ? Pinterest ? Youtube ?Blogvin ? Flickr
O livro é incrível, mesmo. Só havia lido Feliz Ano Velho do Marcelo e este conquistou um espacinho ao lado do antecessor em meu coração.
Fiz um textinho sobre ele também. http://crentassos.com.br/blog/2017/01/ainda-estou-aqui-marcelo-rubens-paiva-terminei.html
Abraço!