Desde que o mundo é mundo, nos deparamos com situações de conflito produzidas pela ruptura de regras morais. E desde sempre um mesmo recurso está à nossa disposição para evitar esses conflitos: a desculpa. Adão, no Éden, quando se viu pressionado pelo Criador por ter praticado o pecado original, não pensou duas vezes e jogou a culpa em Eva. Dialogando com vasto material teórico, que vai da sociologia clássica de Max Weber e Georg Simmel ao atual pragmatismo francês de Luc Boltanski e Laurent Thévenot, passando pela filosofia da linguagem de John L. Austin, Werneck propõe um inovador modelo explicativo para compreender não apenas o papel das circunstâncias na moral, mas toda a maneira como, por meio delas, mantemos de pé nossas relações sociais. Para embasar sua tese, o autor pesquisa quatro casos de usos de desculpas: manuais que ensinam a dar desculpas eficientes; depoimentos da investigação do escândalo do Mensalão; situações da vida de casal; e o uso da velhice como desculpa para descortesias praticadas por idosos. De cada um deles – mas também de exemplos da ficção que vão das peripécias de Brás Cubas à comédia do cotidiano de Seinfeld, e de casos bíblicos que vão de Adão ao Bom Ladrão, passando pela Torre de Babel –, ele prospecta a maneira como nós, que damos desculpas, construímos as circunstâncias com que damos conta de nossas diferenças.
Quanto um livro pode mudar a sua percepção e te mostrar muito mais do que você estava disposto a aprender quando resolveu começar a ler e virou a primeira página? Quantas vezes você, instintivamente pediu desculpas por alguma coisa, as vezes sem nem notar que estava fazendo aquilo?
Eu sou a pessoa das desculpas, qualquer coisa, que eu sinta que fiz errado é automático o meu “me desculpe”. Acho que por esse fato a primeira palavra que eu consegui gravar quando comecei a estudar italiano foi “scusi”.
Se eu vou pedir algo, sempre começo com o “me desculpa.. você pode”, ou então o “me desculpe qualquer coisa” seguindo o protocolo social tão conhecido. Por que? Para que? Será que faço tudo tão errado que preciso sempre estar carregada de desculpas? É uma grande questão, não é mesmo?
Comecei a algum tempo fugir um pouco da “literatura fantasiosa” e explorar outro lado literatura mais técnica. Seja da minha profissão (se alguém quiser algumas resenhas de livros da área de marketing e social media, posso pensar em fazer por aqui). Quanto da área de sociologia e psicologia. Tanto para aprender e melhorar o meu pessoal, quanto o meu profissional. Pois como Social Media estou o dia inteiro interagindo com pessoas, preciso compreendê-las cada vez mais e mais. E isso é a chave para fazer um bom trabalho nessa área (pelo menos na minha opinião). Então quando chegou a lista de livros do Grupo Editorial Record, A Desculpa – As circunstâncias e a moral das relações sociais foi o meu pedido!
O livro é um estudo de Alexandre Werneck baseado em sua tese de doutorado. Werneck que é professor do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e integrante do Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana (Necvu). E é com certeza é um livro que deve ser lido.
Não é uma leitura fácil. Não é algo para ler “em uma sentada” como as vezes eu falo de alguns livros no blog. Você tem que estar ciente que está lendo um estudo, algo diferenciado, algo que o autor passou anos pesquisando e fazendo testes para elaborar sua tese. Não tem uma linguagem fluida ou tranquila. Temos várias referencias durante a leitura que te fazem parar, ir atrás, ler as notas de rodapé, as notas atrás do livro. É complicado sim.
Não é algo que eu recomendaria para os mais novos, não é Kafka ou Dostoiévski que você lê porque é bonito e cult ficar citando frases nas redes sociais, você vai ler para aprender alguma coisa durante esse processo.
Acho que consigo encarar muitas coisas diferentes no final do livro. Compreender melhor o processo gerado pela “Desculpa” e como é a construção desse ambiente. Um livro que não é da minha área, não sou socióloga nem nunca pensei em ser. Mas sou uma curiosa. E quando algo é bom você tem que falar para que outras pessoas descubram e quem sabe tenham um pouco de curiosidade para descobrir sobre esse ambiente.
Não quero me aprofundar sobre a questão da desculpa, do estudo. Porque me sentiria como se eu estivesse julgando o trabalho de alguém e não evitaria o “scusi signori” no final da resenha. Então digo apenas que eu recomendo. E se vocês confiam em mim (afinal, sempre recomendo aquilo que realmente gosto). Leiam. Deem uma chance. Não devorem o livro. Aprendam, leia uma , duas páginas por dia. Não vamos ser essa geração superficial que tem um mar de conhecimento com um palmo de profundidade. Vamos procurar aprender alguma coisa. Nem que isso seja um estudo sobre algo tão comum em nossa vida. A desculpa.
Com uma xícara de café quentinha aqui do meu lado comemorando o dia nacional do café. Eu dou 4 xícaras para A Desculpa de Alexandre Werneck!