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A lógica da ignorância

Antes de começarmos, gostaria de deixar algo claro: esse texto não terá o padrão Pausa, ou seja, não aconselho que o leia apenas em sua pausa para um café. Guarde esta página nos favoritos e, mais tarde, quando tiver tempo, leia, absorva o conteúdo e procure se informar. Todos os artigos científicos, livros, citações e demais informações válidas que usar neste texto, disponibilizarei no final da página. Estou farto de sensacionalismo barato e o Pausa e seus leitores merecem o melhor de mim, então por isso tomei meu tempo, com calma, para redigir este artigo.

Há um padrão na nossa sociedade hoje em dia, seguido à risca por pais facilmente manipulados e “jornalistas”: se houver um crime brutal e o criminoso em questão jogar vídeo game, é claro que a culpa são dos jogos. O que são os vídeo games se não um bode expiatório para levar a culpa de tudo de ruim que acontece com crianças e adolescentes violentos? Tendo apenas 23 anos e nunca atirado gelo pela mão, apesar de ter jogado muito Mortal Kombat, já passei por muitos desses momentos com meus pais, com os pais de amigos, com conhecidos e com a internet, “vídeo games causam comportamento agressivo”, “o garoto jogava Counter Strike e essa foi a razão de ter cometido uma chacina”, “ele se tornou um exímio arquiteto, era um grande jogador de Minecraft“.

Já escrevi muitos artigos sobre isso, já argumentei com várias pessoas, já enfrentei o mundo para defender minha paixão, tudo no calor do momento, mas não agora, não mais. Tomei tempo para pesquisar e reforçar meus argumentos com evidências científicas e, neste texto, pretendo dizer, de uma vez por todas, a razão de vídeo games não provocarem um comportamento agressivo que já não esteja naquela pessoa.

Vídeo games foram criados como uma forma de divertimento. Quando os primeiros fliperamas começaram a chegar na década de 60 e os primeiros consoles de mesa, na década de 70, eram produtos destinados ao público infanto-juvenil. Desde lá, essas crianças e jovens cresceram e hoje são eles que fazem os jogos que jogamos, desde lá, a indústria também cresceu e os jogos eletrônicos não são mais, apenas, para diversão. Me estranha muito quando uma pessoa me diz “cara, isso é só um jogo”, isso mostra o quão as pessoas ainda vivem em uma ignorância por opção. De maneira nenhuma eu quero dizer que todos os jogos são maravilhosos, mas alguns deles são experiências particulares, que colocam o seu consumidor em situações de reflexão ou de aproveitamento de uma boa história, vivendo uma aventura particular. Tal como ler um bom livro ou assistir a um bom filme, ainda apreciar uma pintura ou uma paisagem natural, jogar um bom jogo é vivenciar uma aventura única, que terá diferentes desenrolares em cada um de seus aventureiros. Mas é claro, quando se trata dos aspectos negativos, os vídeo games passam a ser coisa séria.

Devemos ter mais responsabildiade social
Devemos ter mais responsabildiade social

O preconceito é um comportamento irracional, que envolve emocionalmente, impossibilitando uma avaliação honesta e objetiva da complexidade dos fatos. Em nossa mídia e sociedade, a maioria esmagadora que acusa os jogos eletrônicos de desencadearem a violência são exatamente as pessoas que tem mínimo ou nenhum contato com os mesmos, formando um conceito prévio sobre algo que não entendem ou, por simples escolha, não querem entender.

O melhor jeito de ilustrar isso é falando sobre estereótipos. Sendo imagens simplificadas e caricaturais, são mais fáceis de entender e aceitar do que a imagem mais complexa, é mais fácil pensar que vídeo games são coisas para crianças e que não passam de puro passatempo do que aceitar que é a maior indústria do entretenimento, que pode ajudar na recuperação de doentes, melhorar as funções cognitivas e até mudar, pra melhor, o caráter do jogador.

Pessoas são resistentes quanto ao que não conhecem, sejam em níveis mais altos como etnias, crenças e ideologias até menores, como nosso caso.

Assim como livros e filmes foram no passado, vídeo games ainda encontram resistência para serem algo aceito pelo povo. E quando digo povo, quero dizer que é a maioria da população, a massa. Até hoje, muitos dos integrantes dessa classe ainda acham que ler um livro é perda de tempo e que você precisa ser rico pra ir ver um filme no cinema, então você já pode imaginar a opinião destes sobre comprar um vídeo game. Querendo ou não, é um hobby caro, ainda mais no Brasil, contudo, isso não impediu que os jogos crescessem e conquistassem pessoas de várias idades. O preconceito existe, mas não será xingando muito no twitter que vamos mudar isso.

Quanto ao comportamento violento em si, NÃO HÁ NENHUMA PESQUISA que comprove que vídeo games produzem esse tipo de ação. O comportamento agressivo depende de quatro fatores básicos: desenvolvimento ontogenético – desenvolvimento do ser vivo desde a fase embrionária até seu estado atual -, aspectos da situação onde a pessoa se encontra, relação passada com situações idênticas e os que se prendem ao comportamento da outra pessoa, que pode ou não ser o “adversário”.

Não sou ingênuo de afirmar que vídeo games não induzem NENHUM tipo de comportamento, isso seria mentira. Um exemplo básico é o seguinte: quando era criança, joguei muito Mortal Kombat e achava legal dar socos e chutes e fingir que estava soltando uma corda da mão e falando um inglês tupiniquim para “get over here“. Isso é um comportamento, mas de maneira nenhuma agredia meus amigos ou pessoas próximas a mim. Vídeo games não induzem um comportamento que já não esteja naquela pessoa. Isso envolve vários aspectos como a criação daquele indivíduo e o ambiente onde ocorreu essa criação. Se a criança tem acesso a armas, ou é criada numa família violenta ou em um ambiente hostil, dentre outras circunstâncias, terá uma probabilidade maior de desenvolver comportamento agressivo, em alguns casos como mecanismo de defesa.

É inteligente estudar a pessoa ao invés do jogo. Cada pessoa experiência um fato de um jeito, ta ai a fenomenologia pra explicar, e não há mídia que exemplifica melhor isso nos dias de hoje do que os vídeo games. Eu não precisaria dizer tudo isso aqui se ao menos os pais respeitassem as instituições que avaliam os jogos e a violência neles contida. Se o game é para uma audiência maior de 18 anos, por que uma criança de 8 anos esta jogando? Claro que muitos dos jogos que nós amamos na nossa infância e adolescência eram jogos que nos deveria ser restrito em primeiro lugar, e mesmo assim a grande maioria cresceu e se tornaram adultos responsáveis e sem instintos assassinos, apenas com uma imaginação maior, só que são casos isolados como este do garoto que matou a família de PMs que acontecem que nos fazem parecer psicopatas disfarçados.

Há incontáveis evidências de como os jogos eletrônicos podem ajudar no desenvolvimento humano
Há incontáveis evidências de como os jogos eletrônicos podem ajudar no desenvolvimento humano

Video games promovem união. Quando se esta em uma roda de jogadores, sempre haverá assunto e alegria, da mesma forma com outras mídias, vocês podem pesquisar sobre a Pirâmide de Maslow para se aprofundarem nessa necessidade de união, amizade, respeito. Infelizmente, o que vende hoje em dia é a polêmica. Os “jornalistas” do canal que começou toda essa bagunça, que prefiro não citar para não lhes dar o gostinho de cliques em seus sites, são simplesmente antiéticos, sem limites para conseguir uma notícia e uma explicação para esta o mais rápido possível, pois é isso que o povo quer, as pessoas se sentem incomodadas quando algo da magnitude dessa tragédia recente não tem explicação. Dessa necessidade de explicação e dificuldade de aceitação, ou até mesmo de interpretação dos fatos, é que nascem as teorias da conspiração ou audiência para mídias que clamam ter uma resposta.

Não adianta ir até o site desses canais escrever carta de repudio, pois eles já perceberam que quando mechem com os gamers, que são uma comunidade de pessoas apaixonadas pelo seu hobby, eles vão se comportar emocionalmente e fazer um escândalo, escândalo esse que trará clique e mais clique ao site e à todos seus relacionados. O que acho mais importante não é confrontar estes “jornalistas” e sim procurarmos nos informar sobre nossa paixão, ter conhecimento para passar aos que não o tem. Se um dia alcançarmos esse conhecimento coletivo, não haverá manipulação que se sustentará, mas isso não é nem tanto um problema da nossa comunidade e sim um problema geral.

Minha intenção neste texto foi precisamente essa, de informar. Peço desculpas se em algum momento pareci rude ou incisivo, não foi por vontade, mas assim como todos, gosto de proteger minha paixão, mas cresci o suficiente para saber que não será irritado que o farei. Como disse antes, disponibilizarei a bibliografia usada para este texto, assim como pesquisas científicas sobre video games, mas antes, gostaria que assistissem a dois vídeos. Não vou me delongar, quero que sintam e tirem suas próprias conclusões do que os vídeo games representam para cada um de vocês, assim como suas outras paixões. Com conhecimento, equilíbrio e determinação, podemos mostrar que jogos não são um problema, pelo contrário, podem ser a solução!

Bibliografia consultada:

FIORI, Nicole. As Neurociências Cognitivas. Petrópolis: Editora Vozes, 2008.

 

KANDEL, Eric R; SCHWARTZ, James H; JESSEL, Thomas M. Fundamentos da Neurociência e do Comportamento. Rio de Janeiro: Editora Prentice/Hall do Brasil, 1997.

 

KARLI, Pierre. Neurobiologia dos Comportamentos de Agressão. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1984.

 

QUEIROZ, Renato da S. Não vi e Não Gostei: O fenômeno do preconceito. 1ª edição. São Paulo: Editora Moderna. 1995.

 

 

Pesquisas científicas indicadas:

Serious Games Baseados em Realidade Virtual para Educação Médica

 

The use of the virtual reality as intervention tool in the postoperative of cardiac surgery

 

Virtualização esportiva e os novos paradigmas para o movimento humano

 

O ambiente virtual como interface na reabilitação pós-AVE: relato de caso

 

A (ciber)cultura corporal no contexto da rede: uma leitura sobre os jogos eletrônicos do século XXI

 

A concepção do role-playing game (RPG) em jogadores sistemáticos

 

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