Na estreia do selo Quadrinhos na Cia., o grande mestre do gênero não podia ficar de fora: nas quatro graphic novels reunidas neste livro, escritas nos anos 80 e 90, Will Eisner traça um retrato genuíno, ao mesmo tempo brutal e profundamente humano, da vida na cidade grande. Protagonizadas por personagens singulares, essas pequenas histórias registram momentos às vezes irônicos, às vezes trágicos, da vida dos habitantes da metrópole, revelando muito mais do que “um acúmulo de grandes edifícios, grandes populações e grandes áreas”. Nova York: A grande cidade e Caderno de tipos urbanos são compostos de vinhetas que registram, a partir do cenário da cidade, aspectos do dia a dia de seus habitantes. Esses breves vislumbres iluminam com delicadeza desde as situações mais cotidianas até as reviravoltas mais trágicas. O olhar agudo que se revela nas vinhetas ganha em O edifício e Pessoas invisíveis aspecto mais sombrio. Nessas histórias, que são sobretudo biografias de personagens solitários e esquecidos, Eisner põe em xeque o isolamento e a indiferença impostos pela metrópole.
Verdadeira obra-prima dos quadrinhos, Nova York é um registro impressionante não só da sensibilidade de seu autor mas da vida que se esconde por trás de toda grande cidade.
Esse foi o meu primeiro contato com o autor. Já conheço seu traço e seu estilo de contar histórias há algum tempo, mas suas graphic novels – pelo menos as que me chamavam a atenção – custam caro. Como só possuo essa, não posso afirmar se esse valor vem da popularidade de Eisner ou se é referente à qualidade aplicada ao livro. Nesse caso, acredito que seja uma combinação. A edição de Nova York da Companhia das Letras é composta por mais de 400 páginas de um papel excelente e, mesmo não tendo capa dura, sustenta uma substituta à altura. Eu, na verdade, até prefiro grandes volumes em brochura. Quando bem feito causa menos acidentes.
Como foi citado na sinopse, este volume reúne quatro trabalhos de Will Eisner. A primeira, que dá título ao tijolo, é Nova York: A Vida na Grande Cidade. Em seguida temos O Edifício, depois Caderno de Tipos Urbanos e por último Pessoas Invisíveis. Em duas dessas graphic novels o autor trabalha com espécies de contos, onde mostra o cotidiano na cidade grande. As outras duas restantes são compostas por histórias completas.
Vou falar de Nova York como um todo porque em minha opinião deve ser lido de cabo a rabo, sem pausas e sem escolhas. O motivo é simples: é possível reparar alguns personagens de uma obra em outra. Até mesmo os desenhos de fundo, aqueles figurantes que servem apenas para preencher cenário, podem estar em outra página. Uns até se tornam protagonistas. Isso cria uma euforia estranha na gente. Quando percebemos que determinada personagem estava antes em um simples quadro, logo nos empolgamos para saber o que vai acontecer. Isso porque no quadro, ou nos quadros anteriores de uma vinheta, Eisner já dá uma boa dica de como ela se comporta, porém pessoas são pessoas, ainda mais nessa reunião de livros, e é aí que podemos nos surpreender.
Nova York funciona assim: pegue uma cidade muito grande, com um ar mais antigo do que o da época em que o volume foi feito, – talvez por retratar as memórias do próprio autor – e nela inclua seus habitantes. Um bairro comum aqui e ali. Pobres, ricos, homens, mulheres e crianças. Não há limite para a imaginação. O que for mais simples e banal pode rolar e a história mais absurda também. O mais incrível disso tudo é a forma como Will Eisner cria e produz, na maioria das vezes sem nem existir diálogos. Eu acostumei a chamar os quadros dos quadrinhos de… bom, é óbvio que de quadros, mas em Nova York as vezes isso não é necessário. Esse detalhe me encantou. É como se tudo fosse um ensaio, ou como ele mesmo põe no título, um caderno de desenhos. Sabe aqueles sketchbooks que os artistas fazem? Para ajudar na criação, fazer artes conceituais? Pois é, as vezes lembra muito isso. Uma mulher na janela, gritando com seu marido que está na entrada do apartamento, onde esse discute com o síndico. Tudo isso em uma tira, digamos assim, sem que seja necessária uma divisão em quadros. A janela onde a mulher está precisa apenas ser moldada, sem finalização de um prédio por completo e, logo ao lado, com a perspectiva de altura, o homem discute com o síndico. É MA-RA-VI-LHO-SO! Esses exemplos estão por todo o volume, mas Will Eisner também sabe aplicar detalhes como ninguém!
A princípio os protagonistas são locais de um bairro e tudo que gira em torno desse tema desenvolve uma pequena história. Pode ser a escadaria de um edifício, pode ser o bueiro da esquina, podem ser as janelas de um prédio ou pode ser qualquer coisa. Basta estar enraizado à cidade grande e pronto. Pode-se dizer, a partir disso, que Will Eisner é o gênio da narrativa gráfica. Até quando a simplicidade perde lugar para um roteiro mais comprido e detalhado, conseguimos visualizar o outro lado de sua criatividade, que da mesma forma nos surpreende.
Outro ponto muito mais que importante e que deve ser comentado diz respeito ao contexto social. É fácil perceber, logo nas primeiras páginas, as críticas que Eisner faz à sociedade. Se por um lado sentimos aquele aconchego em algumas passagens por apresentar um ar familiar, seja nas confusões ou na paz, por outro existe a negatividade da fofoca, da curiosidade, do descaso aos pobres, da gritante diversidade entre as pessoas e seus preconceitos, as mentiras… e por aí vai. É uma aula sobre a vida.
Os traços de Eisner podem ter variações. Aqui em Nova York temos, na maioria das vezes, um ar caricato sem exageros. Uma vez ou outra ele aplica uma coloração mais densa, em tons de cinza, já que essa é mais uma publicação em preto e branco que leio, tornando o aspecto da cena mais profissional. Em um ou duas situações também podemos visualizar o traço que o autor utilizava em Spirit, onde o estilo é mais cartunesco, mas não tão longe do que vemos na edição inteira. Além de também existirem momentos com uma espécie de aquarela, onde a arte fica um pouco embaçada para retirar o peso dos contornos. Enfim, as surpresas não param um minuto sequer durante a leitura deste livro. Minha nota seria 10, mas como nosso limite é 5, então dou nota máxima sem nem pensar duas vezes.
Indico Nova York: A Vida na Grande Cidade a qualquer um. Criança, jovem, adulto, idoso… não existe idade. Até mesmo para quem não se sente atraído por quadrinhos. Tenho certeza que dessa vez qualquer um dará a mesma nota que eu.
Apesar de não conheçer o trabalho do autor, eu gostei! Os desenhos são muitos realistas, a rotina, a critica que ele faz a sociedade e outros aspectos.
Vale muito conferir sim, Caroline.
Não conheço o autor também, mas gostei do quadrinho e curto essa crítica da sociedade.
Livro bom, porém não tão acessível.
Acho difícil eu tê-lo em mãos…
beijos
Eu não conhecia a obra, mas gostei da resenha. Achei bem legal os personagens que aparecerem ali por o caso, sem motivo aparente e de repente se tornam protagonistas. Tá ai um livro bacana de se apreciar, pena que o preço é bem salgado. Adorei os traços dos desenhos. Uma curiosidade, porque a fonte do nome do autor é aquela fonte da Walt Disney? Tem alguma ligação?
Sobre importâncias
Talita, a respeito da fonte, existe uma pequena discussão por aí sobre isso. É o estilo de assinatura que ambos os artistas tomaram para si e o que faz os fãs de cada um discutirem é quem fez primeiro. Se repararmos em algumas letras, como o S, conseguimos ver diferença. Eu acredito que seja pura coincidência.
Gostaria muito do pdf deste livro : nova york a vida na grande cidade de will eisner
alguém pode me ajudar
Gostaria de recomendações de outros livros dele, alguém??