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Úrsula, Maria Firmina dos Reis

É impossível começar a falar sobre o livro “Úrsula”, sem antes falar da autora dele, a Maria Firmino dos Reis, para que possamos compreender a sua tamanha importância.

Isso por que Maria Firmina dos Reis foi simplesmente a primeira autora brasileira de origem afro a publicar um livro. Ou seja, “Úrsula” é o primeiro livro do gênero romance a ser publicado por uma mulher. Uma mulher negra.

Maria Firmina nasceu no Maranhão em 1825. Aos 22 anos foi a primeira mulher da cidade de Guimarães aprovada em um concurso para professora primária. Começou sua produção literária e em 1859 publicou seu primeiro livro, “Úrsula”. Ele foi bem acolhido pela crítica, apesar do seu sexo ter sido uma grande questão, ela também começou a contribuir para jornais com contos e novelas. Ela também foi a fundadora da primeira escola mista do Maranhão.

Olha só quanto pioneirismo, quanta contribuição e atividade intelectual compartilhada ao longo da vida, e incrivelmente, ela é pouco ou quase nada lembrada. Há pouquíssimas referências nas historiografias sobre sua obra. Eu mesma só tomei conhecimento da autora, ao ler “Extraordinárias: mulheres que revolucionaram o Brasil”, coletânea de mini-biografias de grandes mulheres brasileiras, publicada pela Companhia das Letras em 2017, pelo selo Seguinte.

Ela morreu aos 92 anos, cega, pobre e sem a exaltação merecida.

Só a história da  Maria Firmina dos Reis levanta muitas discussões sobre o silenciamento feminino, principalmente o da mulher negra na literatura. Consumimos aos montes as obras dos grandes autores, que contribuíram sim magnificamente para a Literatura Brasileira, mas esquecemos e não demos importância ao pioneirismo da primeira romancista brasileira. É uma dívida incalculável, ela merecia mais.

Porém, fiquei imensamente feliz ao saber que a editora publicaria Úrsula, com uma edição que contém uma rica introdução e contextualização histórica, celebrando a importância para a literatura nacional, dando assim, o destaque que ela merece. A edição conta com estabelecimento de texto e introdução de Maria Helena Pereira Toledo Machado e cronologia de Flávio Gomes.

Mas até agora não falei sobre o livro em si, né?! Bom, então vamos lá!

O livro conta a história da personagem-título, uma mulher branca, bem nos moldes de heroína dos livros da época. Ela se apaixona por Tancredo, jovem honrado e também bem dentro dos moldes da época. O enredo é aquele ultraromântico, seguindo o estilo do Romantismo, que era o movimento literário em ascensão, onde os dois jovens vivem um amor impossível e tem de lidar com o sofrimento e a fúria dos familiares. “Úrsula” foi considerado um livro abolicionista, por dar voz a dois personagens que são escravos, e relatam a brutalidade e a desumanidade de como a liberdade lhes foi tirada.

“Meteram-me a mim e a mais trezentos companheiros de infortúnio e de cativeiro no estreito e infecto porão de um navio. Trinta dias de cruéis tormentos, e de falta absoluta de tudo que é necessário à vida passamos nessa sepultura até que abordamos às praias brasileiras. Para caber a mercadoria humana no porão, fomos amarrados em pé e para que não houvesse receio de revolta, acorrentados como animais ferozes das nossas matas.(…) Davam-nos água imunda, podre e dada com mesquinhez, a comida má e ainda mais porca: vimos morrer ao nosso lado muitos companheiros à falta de ar, de alimento e de água. É horrível lembrar que criaturas humanas tratem a seus semelhantes assim e que não lhes doa a consciência de levá-los à sepultura asfixiados e famintos!”

“Úrsula” é na verdade uma mescla desse enredo ultraromântico, com uma abordagem crítica à escravidão, retratando homens autoritários e cruéis, e problematizando como as mulheres eram subjugadas aos desejos dos homens.

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Dá pra imaginar o quão transgressor foi esse livro, ao trazer temáticas como essas numa época com a escravidão em curso, e onde as mulheres não tinham poder da própria voz, ainda mais uma mulher negra?!

Pra mim, a leitura desse livro é uma de forma de nos redimirmos com a autora e com sua história, com tudo que a contribuiu intelectualmente. Além de nos proporcionar uma perspectiva mais plural da literatura clássica nacional.

Recomendo um milhão de vezes!

Onde Comprar:
Submarino

Maria Firmina dos Reis nasceu em São Luís do Maranhão, em 11 de março de 1822. Entretanto, seu batismo ocorreu apenas em 21 de dezembro de 1825, constando na certidão sua condição de “filha natural” de Leonor Felippa dos Reis e estando ausente do documento o nome de seu pai (ADLER, 2017). Afrodescendente nascida fora do casamento e vivendo num contexto de extrema segregação racial e social, aos cinco anos ficou órfã e teve que se mudar para a vila de São José de Guimarães, no município de Viamão, situado no continente e separado da capital pela baía de São Marcos. O acolhimento na casa da tia materna teria sido crucial para a sua formação (Mott, 1988).

{ Esse livro foi enviado pela editora Penguin Companhia para resenha no blog. Em compromisso com o leitor, sempre informamos toda forma de publicidade realizada pelo blog 

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